segunda-feira

piano

olho o jornal, nenhum sentido, ainda assim faz algum sentido.
um sentido ruim, um sentido de merda que não pode ser sério,
e é porque é o que se vive de alguma forma.
é natal, e bento novecento diz que é preciso lembrar, esse é
o lema da igreja, é preciso lembrar sempre, não é por acaso
que o catolicismo/cristianismo deriva do judaísmo.
lembrar sempre, viver na redoma no passado e das leis do
passado, agora é apenas um interstício para a reafirmação
da tradição e do que nunca foi num futuro próximo.
sim, morrer, talvez, e encontrar o messias depois, ou morrer
e encontrar o pai do messias na porta que leva ao outro lado.
nunca entendi qual a real diferença em termos práticos, sempre
me pareceu que era só uma questão de dominação e poder,
quem é e quem não é, quem fica e quem vai, quem entra e quem
fica do lado de fora, da mesma forma como fazemos por aqui.
vou ouvindo então o meu amigo falecido, um dos vários, que
já passou por esse momento de se ou de o quê, e fumo um sumatra
e sigo com o cawarra tinto, e vou ouvindo satie e as variações
infinitas da gnossièmmes e das gymnopédies e tudo bem, natal,
aeroportos no caos, mas o que não?, e ao mesmo tempo pensamos
sempre que estamos a salvo de alguma forma, porque somos nós
sempre que estamos aqui dentro, não?, e a música o silêncio a literatura
o cinema e algumas outras poucas coisas sempre nos confortam e nos
elevam (e enlevam), sempre, e outra vez e outra.
o conforto é o que nos mantém.


(mas o conforto também é uma um revolucionário fraco e preguiçoso.)